domingo, 28 de setembro de 2014

Cartas a um Soldado Esquecido - Parte 3

06:30 da manhã. Silêncio.

Então ouvem-se as primeiras vozes confrontando este ser gélido e estático que grita aos ouvidos de quem teme a noite escura e vazia. O silêncio é trincado por estas vozes. Mas é estilhaçado pelo rugir das turbinas dos aviões de transporte que se preparam para levar de seus lares todos aqueles homens e mulheres que deixam para trás vidas, e nessas vidas saudades eternas.

O 1º Sargento Jonas Park, do 2º Regimento Aéreo Brasileiro (2º RAB) caminha em meio a essa multidão. É apenas mais um, que a Mãe Pátria conclamou para servi-la, para cumprir seu dever como filho resignado.

"Amor à Pátria!" - Gritavam os Veteranos ao ouvido daqueles que caminhavam para longe do Lar.
E alguns, como forma de compreender o sacrifício que faziam por sua "Mãe Gentil", cantarolavam baixo, para si mesmos - "Ou Deixar a Pátria Livre, Ou Morrer Pelo Brasil..." - Ela contemplava admirada seus "filhos" que verdadeiramente Não fugiam à Luta e caminhavam rumo ao desconhecido.

Ainda o mesmo Frio persistia e se aprofundava nas roupas e nas carnes daqueles soldados. Alguns já batiam os dentes e o restante tremelicava sem parar. O vento Sul, que caía Úmido e Gelado, os castigava ainda mais, e após quinze minutos se ouvia um barulho comum de pés saltitando e corpos se mexendo, como numa dança folclórica, para expulsar o frio. A cena era, de certa forma, cômica.

- Ei! Sargento!
Jonas olhou para o lado, com cara de poucos amigos. - Capitão... - deixou que a reverência escapasse de forma subalterna e insatisfeita.
- Rapaz, que cara é essa? Até parece que tá indo pra guerra sem esperança de algum dia voltar pra casa... - Disse o Capitão, sorrindo e "tentando" amenar a sensação de desconforto causada pelo momento.
O lado esquerdo dos lábios do 1º Sgt. Park se ergueu firme, insinuando um pobre sorriso, e logo após retomou a seriedade anterior e o tremelicar desordenado.
- Ok. Direto ao Ponto não é? Fui convocado a permanecer aqui na Base para auxiliar a torre com as estratégias de combate aéreo. Resumindo, fui escolhido para ser seus olhos quando eles o enganarem e mesmo quando o forem fiéis.
- Ah é? E o que aconteceu com o "não importa o que aconteça cara... vou sempre estar aqui." ?
- Jon! Qual a melhor forma de eu sempre estar próximo a você? Digamos que eu fosse ao combate, e liderasse o seu Regimento nos Ares. O que aconteceria se eu fosse abatido? Quem você teria para te guiar e auxiliar em batalha? Você seria o próximo! Acredita em mim meu chapa. No chão é melhor. "Pés no Chão, Olhos nos Ares" - Disse o Capitão Eliel Sold repetindo os dizeres de batalha do 2º RAB.
- Pés no Chão, Olhos nos Ares. - Repetiu Jonas desanimado.
- E mais uma coisa. - Remexeu a bolsa à procura de algo. Puxou uma caixa de madeira fina, cuja tampa abria e fechava como uma boca. A caixa estava trancada com um cadeado pitoresco. E ele disse - Pras horas difíceis... - Entregando a chave.
Jonas tomou a caixa em suas mãos, abriu sua mochila, e a pôs cautelosamente em meio àquela mistura de itens de sobrevivência. Eram um Kit de primeiros socorros no fundo, uma caixa com suprimentos alimentares à esquerda, uma pequena pistola encaixada em um bolso à direita onde também continham algumas munições, e um vazio no meio, que foi preenchido por aquela caixa de aparência simples e grotesca.
- Pras horas difíceis. - Repetiu Jonas como sinal de afirmação, e seguiu para o avião com a cabeça baixa.

Ela não se importa mais. - Pensou. - Não fez nada... Não se importa. - E assim como Jeniffer ele chorou. Lágrimas grossas e silenciosas, que continham toda a tristeza de um coração abandonado.

07:00 da manhã. O avião partiu. Jonas partiu.

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